Cinema

O Segredo de Sikán: filme que envolve mitologia africana e fantasia será gravado na Bahia

Longa começa a ser filmado em outubro

Veja o resumo da noticia

  • Filme O Segredo de Sikán será filmado na Bahia
  • Grace Passô, primeira dramaturga negra a receber o Prêmio Shell de Teatro, está cotada para o elenco
  • Gravações começam em outubro
Foto:: Flávio Rebouças/Divulgação
Foto:: Flávio Rebouças/Divulgação

O Recôncavo Baiano será set de filmagens de O Segredo de Sikán, primeiro filme de ficção da cineasta cachoeirana Everlane Moraes. Entre os nomes em negociação para o elenco, está a atriz Grace Passô, primeira dramaturga negra a receber o Prêmio Shell de Teatro, um dos mais importantes das artes cênicas do Brasil.

Com início das gravações previstas para outubro de 2025 nas cidades-irmãs de Cachoeira e São Félix, o longa-metragem demonstra um mito africano e mergulha no realismo fantástico – gênero que mescla elementos reais e sobrenaturais – para discutir temas sensíveis e atuais como o protagonismo feminino e disputas territoriais.

Sobre a obra

No mito original, Sikán é uma princesa da Nigéria antiga escolhida por uma divindade para guardar segredo que traria paz ou guerra ao mundo. No entanto, ela é julgada e assassinada por homens, por, supostamente, revelar o mistério.

Everlane reconta a história, afirmando que Sikán não contou o segredo, e para se livrar da sentença, se lançou no rio Odan. Assim, se transformou em um peixe mágico que navegou por séculos até chegar ao rio Paraguaçu, na Bahia. No local, com o conhecimento da profecia, lutou em busca de justiça e do retorno do sol para o seu povo.

De acordo com a diretora, a ficção pretende ressignificar o papel da mulher na narrativa, mudando a perspectiva original permeada por uma lógica misógina.

“Os mitos são histórias geralmente contadas por homens em diferentes épocas e contextos históricos. Nesse em específico, Sikán foi morta por ser uma mulher frágil e passiva, assim como muitas outras personagens femininas de outras tantas narrativas já conhecidas. Resolvi então mudar o caráter da personagem, de indiscreta e indefesa, para discreta e corajosa, mudando assim o seu destino. A partir disso, pensei em fazer um filme onde as mulheres estivessem no centro do discurso, protagonizando o mito e narrando-o do ponto de vista delas”, endossou.

Difundida por uma sociedade secreta masculina de Cuba (Abakuá), o mito chegou ao conhecimento da autora através de residência no país entre 2015 e 2018, onde estudou Cinema na Escuela Internacional de Cine y TV (EICTV). A motivação de trabalhar com o tema surgiu através do contato com obras de Belkis Ayón (1967-1999), artista cubana que iconografou o mito da princesa e que terá seu legado homenageado no filme através da personagem Sara.

Desenvolvimento e premiações do projeto

Durante a fase de desenvolvimento, o projeto acumulou passagens em laboratórios nacionais e internacionais. Além disso, recebeu a premiação como o Melhor Projeto em Desenvolvimento no BrasilCineMundi, em Belo Horizonte, e no fundo holandês para projetos cinematográficos, o Hubert Bals Fund.

Assim, através do Lab Negras Narrativas, da Associação dos Profissionais do Audiovisual Negro (APAN), em 2023 Everlane viajou à Nigéria. Lá ela estudou o mercado do cinema no país e conheceu de perto o território que originou o mito.

“Na Nigéria, tive a oportunidade de visitar a Floresta Sagrada de Osun-Osogbo, um Patrimônio Mundial da Unesco, localizado no sudoeste do país, para buscar a proteção para esse rio, relacionando-o ao rio Paraguaçu, em Cachoeira. Também apresentei o projeto ao mercado local, conhecido como Nollywood, segunda maior indústria cinematográfica do mundo em termos de produção, conhecendo possíveis parceiros e principalmente buscando uma janela de exibição para levar essa história até o público nigeriano, já que o mito que dá origem ao filme começa em Calabar, capital do estado de Cross River, originalmente chamada de Akwa Akpa, na língua Efik, povo que domina esta área”, contou.

Locações e temas centrais

As gravações serão predominantemente noturnas. Elas acontecerão nas cidades de Cachoeira e São Félix, ambas com grande contribuição para luta pela Independência do Brasil na Bahia.

Então, separadas e unidas pelo rio Paraguaçu, a obra representa o curso de água como pano de fundo de tensões sociais e conflitos hídricos e territoriais.

Em fase de produção, o projeto conta, exclusivamente, com atores e atrizes negros e negras, com destaque para a formação de um elenco local. Todavia, grandes nomes do cinema nacional ainda estão a confirmar.

“A intenção sempre foi de viabilizar uma produção que pudesse respeitar a assinatura artística da Everlane, mas que também se comunicasse com o nosso público. O filme, então, nos leva a um mundo distópico, onde não há a luz do sol, e duas cidades vivem buscando formas de sobreviver: Cachoeira, uma cidade matriarcal, vive sob a luz de velas. No acordo ancestral, em troca da terra empobrecida, perdeu o acesso ao Rio Paraguaçu. Já São Félix, a cidade industrial e com os homens no poder, se desenvolveu ao longo dos anos retirando uma luz mágica do fundo do rio, tendo vitalidade para as plantações de alimentos e aos seus guerreiros. Pela falta de luz, as mulheres de Cachoeira estão padecendo de um mal, o adormecimento”, disse Fernanda Vidigal, produtora do longa.

Produção e distribuição

Assim, O Segredo de Sikán é uma coprodução da Carapiá Filmes e da Pattaki Produções, com distribuição da Embaúba Filmes, mesma distribuidora de “Marte Um”, de Gabriel Martins, filme brasileiro indicado ao Oscar em 2023. Contudo, o projeto conta com apoio local da Odé Produções e recursos do edital do Fundo Setorial do Audiovisual da Ancine, Novos Realizadores, e do o edital estadual da Bahia Lei Paulo Gustavo.