Tradição ilegal

Operação estoura esquema de fogos ilegais da Família Prazeres no Recôncavo

Foto: Divulgação/Polícia Civil
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Duas pessoas detidas, três locais de produção de artefatos interditados e apreensão de 2.880.791 unidades de fogos, além de 61 quilos de bombas a granel armazenadas em sacos plásticos. Esse é o saldo da operação Brincar com Fogo, realizada em conjunto por cinco órgãos públicos no município de Santo Antônio de Jesus, no Recôncavo baiano, na quarta (14) e quinta-feira (15).

As equipes de fiscalização visitaram nove locais apontados por denúncias e trabalho de inteligência policial. Em três deles, foram encontrados materiais ilegalmente armazenados, com risco não só a quem atuava na produção, transporte e venda dos fogos, mas também a vizinhos. Foi o caso de um depósito numa casa no bairro Maria Preta, em SAJ, repleto de fogos com grave risco de explosão. Há algumas semanas, uma casa usada para o mesmo fim explodiu na cidade de Muniz Ferreira, na mesma região. De acordo com a polícia, a investida também aconteceu em Cruz das Almas.

A operação Brincar com Fogo conta com a participação do Ministério Público do Trabalho (MPT), da Polícia Civil, do Departamento de Polícia Técnica, do Exército e da Superintendência Regional do Trabalho (SRT-BA), órgão do Ministério do Trabalho e Emprego.

Foto: Divulgação/Polícia Civil

Fumando em imóvel com fogos

Todas as apreensões têm ligação com Gilson Prazeres, apontado como o líder do grupo criminoso. Além de Ariosvaldo Prazeres, irmão de Gilson, também foi detido Pedro Marcos Peleteiro de Araújo, um dos gerentes da rede de comércio ilegal de fogos. Conforme o MPT, ele estava fumando no interior do imóvel, uma casa simples de propriedade dele na Rua Raimundo Ribeiro Sampaio, no bairro de Maria Preta, completamente tomada por caixas de artefatos prontos para venda. Ambos foram conduzidos para a delegacia da Polícia Civil do município, ouvidos e liberados.

Até o fim da noite de quarta-feira, equipes do Departamento de Polícia Técnica faziam a contagem do material apreendido, que preencheu as carretas de quatro caminhonetes. O material foi colocado em um caminhão-baú para ser levado a uma pedreira para ser destruído ainda esta semana, sob a supervisão do Exército.

Segundo explicou a procuradora do MPT Juliana Corbal, as apreensões precisaram ser inutilizadas porque são completamente ilegais, já que não havia autorização para a compra de pólvora e para a produção de fogos, além de todas as ilegalidades trabalhistas. Tanto Gilson quanto as empresas a ele ligadas estão proibidos por liminar obtida pelo MPT junto à Justiça do Trabalho de produzir, armazenar, transportar e comercializar fogos de artifício e suas matérias-primas. A liminar estabelece multa de R$ 200 mil em caso de descumprimento, valor que será cobrado em juízo.

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Um dos locais interditados ontem que funcionava como uma fábrica ficava na zona rural, em uma casa num pequeno sítio. Lá havia máquinas para embalagem dos fogos, que traziam o CNPJ de uma empresa em nome da esposa de Gilson Prazeres. Também foram identificados mais dois locais usados pelo grupo: uma fazenda e uma casa num bairro residencial. Os locais foram interditados pela auditoria-fiscal do trabalho, que deverá ainda autuar seus proprietários por uma série de irregularidades trabalhistas ligadas à falta de condições de saúde e segurança do trabalho.

Família Prazeres, tragédia e novo modus operandi

Os três pontos interditados têm ligação direta com o grupo econômico de Gilson Prazeres, da família responsável pela maior tragédia da história da Bahia. Ele é filho do falecido Osvaldo Prazeres Bastos, o Vardo dos Fogos, que era dono da fábrica que explodiu em 1998, causando a morte de 64 pessoas, dentre as quais 20 crianças. Todos trabalhavam na fabricação de fogos.

Gilson deu continuidade ao negócio, mudando a forma. Em vez de uma grande fábrica, espalhou a produção por residências, pequenos depósitos, galpões de fazendas. Ele comanda um grupo empresarial que tem irmãos, esposa e outros colaboradores, proibido desde o ano passado por decisão da Justiça do Trabalho de manter a atividade.

Foto: Divulgação/Polícia Civil

Eles criaram sistema para dificultar a fiscalização e esconder a real operação de um grupo econômico forjado para manter a produção e venda ilegal de fogos. A tese do MPT, apresentada em ação civil pública protocolada em agosto de 2024, foi acolhida integralmente pela Justiça do Trabalho no julgamento do pedido de liminar.

Na decisão, a juíza Adriana Manta ainda estabelece multa de R$200 mil por cada item da sentença que for descumprido, valor que será cobrado em juízo pelo MPT a partir das irregularidades identificadas.

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Gilson foi alvo de duas recentes operações que flagraram a produção ilegal de fogos no município. Em dezembro de 2023, ele, que foi vereador por três mandatos na cidade, chegou a ser preso em flagrante durante fiscalização conjunta realizada na região. No ano passado, nova inspeção identificou a produção ilegal em uma chácara de sua propriedade também em Santo Antônio de Jesus. Dentre as irregularidades nas empresas que ele controla indiretamente, Fogos Boa Vista, Fogos Import e Fogos São João, estão o transporte e armazenamento de material explosivo sem cumprimento de normas de segurança e sem autorização necessária do Exército.

A investigação apontou que desde que as autoridades buscaram a responsabilização da empresa da família pela tragédia de 1998 e pelos acidentes de menor impacto que vêm ocorrendo desde então, eles passaram a atuar na informalidade, pois, dessa forma, os rigores da lei (como o controle exercido pelo Exército Brasileiro, pelo Corpo de Bombeiros, pela Superintendência Regional do Trabalho na Bahia, pelo Crea Bahia ou pelo Conselho Regional de Química da Bahia) seriam menores, mas com margens de lucro maiores.

As tentativas de responsabilizar os donos do empreendimento esbarravam sempre na inexistência de uma pessoa jurídica que pudesse arcar com os danos causados a toda a sociedade.

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