
Na Festa Literária Internacional do Pelourinho (Flipelô), o designer gráfico e ilustrador Eddy Azuos apresentou a seu mais recente projeto “A Lenda do Badauê”, um cordel ilustrado que mistura fantasia, cultura afro-brasileira e uma importante mensagem de resistência.
Inspirado na capoeira e em símbolos da cultura local, o autor criou um super-herói negro para preencher uma lacuna no imaginário infanto juvenil, um universo ainda carente de referências que reflitam a diversidade.
O cordel narra a história do Moço do Badauê, um herói capoeirista chamado para restaurar a paz em Salvador, uma cidade dominada por uma onda de violência inexplicável. A obra dialoga com a memória do Mestre Moa do Katendê, capoeirista brutalmente assassinado em 2018, e traz à tona a luta contra o ódio e a intolerância.
Durante a Flipelô, Azuos conversou com o PS Notícias sobre o processo criativo, as inspirações e a importância da representatividade na literatura infantil. Ele contou que, apesar do cordel ser um gênero tradicional, para ele surgiu como uma consequência natural do seu trabalho com poesia.
Equilibrar a linguagem simples da narrativa infantil com a poesia rimada foi um desafio que Azuos encarou com sensibilidade.
“Quando a gente fala o que tem no coração de forma simples, todos entendem. Adicionando poesia, rima, a leitura fica leve e gostosa, do jeito que crianças e adultos conseguem acompanhar,” contou o autor.
A ideia do super-herói capoeirista vem de uma paixão antiga. Desde criança, Azuos sentia que faltava um personagem assim no universo das histórias em quadrinhos e livros ilustrados. “Meu TCC foi sobre isso, criar um super-herói inspirado na capoeira,” disse ele. “A capoeira não é só luta, é protesto, denúncia, é a voz da população negra através da música e dos golpes”.
Inspiração
O assassinato do Mestre Moa do Katendê foi um marco para o autor. “Foi um momento difícil para a nossa comunidade. Como artista, eu respondi com meus versos. O personagem do cordel é uma homenagem, não uma biografia, mas é inspirado no mestre,” destacou. O Moço do Badauê simboliza a resistência, a esperança e a luta contra o mal que ameaça a cidade.
A escolha do nome e do visual do herói também tem um forte vínculo cultural. “O nome vem do Afoxé-Badauê, bloco que o mestre ajudou a criar. E os traços do personagem , o tom da pele, o formato do nariz, a boina, a mochilinha onde ele guarda suas ferramentas, são baseados no fenótipo do mestre Moa,” explicou Azuos.
A obra traz ainda referências ao Tororó, local onde o mestre vivia e que, na história, é o ponto de origem dos poderes do herói. “Lá temos as estátuas dos Orixás, que dão força ao Moço do Badauê,” contou. “É uma forma de perpetuar a memória do mestre e a cultura que ele tanto valorizava.”
A Lenda do Badauê representa uma importante conquista para a literatura infantil brasileira. Como destacou Azuos, “é uma obra para quem quer ver heróis que representam a nossa história, nossa cultura e nossa luta”.