
Cada vez mais mulheres estão adiando o desejo da maternidade. Esse fenômeno não é um caso isolado, mas uma tendência mundial, principalmente, em países desenvolvidos. A priorização da carreira e a busca por estabilidade financeira são alguns dos fatores que têm colocado a vontade de ser mãe em segundo plano.
Segundo dados do Instituto Brasileiro de Geografia e Estatística (IBGE), divulgados no ano passado, o número de mulheres que optaram pela maternidade após os 40 anos cresceu 65,7% em 12 anos.
O avanço da medicina tem contribuído para esse poder de escolha. Cada vez mais mulheres estão tendo acesso a métodos e recursos como relação sexual programada, métodos de fecundação em laboratório e exames para avaliar a função reprodutiva da mulher ou do casal.
Em entrevista ao PS Notícias, a médica obstetra Adriana Monteiro comentou sobre a independência feminina e a influência da carreira na tomada de decisão pela maternidade tardia.
“Atualmente, muitas mulheres estão postergando a maternidade de acordo com seus trabalhos, seus empregos, e fazendo com que deixemos de engravidar lá na adolescência ou vida adulta jovem para engravidarmos após os 40 anos. O trabalho, as pressões sociais, o desejo de crescimento pessoal nos faz desejar a maternidade um pouco mais na maturidade”, comenta Monteiro.
Os desafios
A maternidade tardia pode conter alguns obstáculos pelo caminho. O ato de engravidar por si só, após os 40 anos, já é um desafio. O corpo da mulher que está nessa faixa etária começa a passar por mudanças hormonais para a chegada da menopausa e muitas vezes doenças prévias como diabetes, obesidade e doenças tireoidianas podem aparecer. Além disso, alguns hábitos como o consumo de álcool e do fumo comprometem a saúde dos óvulos, o que dificulta a fecundação.
A obstetra Adriana Monteiro explica ainda que além da dificuldade de engravidar nessa faixa etária, há outros desafios ao longo da gravidez de mulheres 40+, classificada como de alto risco.
“Segundo as estatísticas, as mulheres acima de 40 anos têm mais chances de doenças como pré-eclâmpsia, que é a pressão alta do fim gravidez, diabetes gestacional, parto prematuro e restrição de crescimento fetal. Isso acontece porque o corpo já estava se preparando para a menopausa, para finalizar a vida reprodutiva e aí ocorre a gravidez”, explica a especialista.
O medo de doenças e síndromes — Down, Edward e Patau — em bebês acaba gerando preocupações em muitas mulheres que decidem ser mãe nessa idade. Porém, a médica explica que de forma geral a gravidez tende a ser normal e tranquila, mas é importante que a mãe tenha o acompanhamento necessário
“É uma gravidez que exige mais consultas, às vezes mais exames, mais suplementos, redução da carga-horária de trabalho, mais disciplina com atividade física, alimentação, às vezes exige que outros profissionais também façam o acompanhamento além do obstetra. É uma gravidez que exige mais cuidados, mas isso não significa que não será saudável”, reitera Monteiro.
Bicho de sete cabeças
A consultora Gilvandira Paim, 53 anos, é uma dessas mães que decidiram engravidar com 40 anos. Ela contou ao PS Notícias que sempre teve vontade de aumentar a família, mas que teve dificuldades de engravidar pela idade. No início teve receio, mas ficou tranquilizada após perceber que essa não era uma realidade isolada.
“Quando eu ia para as consultas, quando eu ia para fazer as ultrassons, eu encontrava casais mais velhos e até falava com o meu marido: ‘Olha, está vendo? Não é só a gente’. A ansiedade mudou em relação a isso e hoje a maternidade aos 40 anos não é mais nada visto como algo impossível, nem um bicho de sete cabeças. As mulheres estão preparadas e mais maduras até para enfrentar uma maternidade”, afirma Paim.
Por outro lado, a obstetra Adriana Monteiro aponta que antes de pensar na gravidez aos 40 anos, é importante saber que algumas doenças desenvolvidas na gestação podem permanecer após o nascimento do bebê.
“Após o parto, muitas mulheres que tiveram alguma complicação na gravidez continuarão com essas patologias, diferente das mulheres abaixo de 30 anos. Então muitas vezes mulheres que tiveram pré-eclâmpsia podem continuar hipertensas, muitas vezes as mulheres que tiveram diabetes gestacional podem permanecer diabéticas, mulheres que desenvolveram problemas de tireoide, podem permanecer com esses problemas no pós-parto”, explica Monteiro.
A maternidade também passa a ser um desafio no quesito energia. Gilvandira Paim, conta que ter disposição para cuidar e brincar com a filha é um grande desafio também. Ela recorda que na primeira gravidez, quando era mais jovem, tinha mais disposição para brincar, mas que na segunda gravidez, aos 40 anos, teve que se reinventar.
“O principal desafio está na energia de acompanhar uma criança, o ritmo da criança que exige muita disposição. A maturidade nos ajuda a lidar melhor também com essas dificuldades. Como eu também nunca fui uma pessoa muito parada, sempre fui muito agitada, então isso também me ajudou. Quando a criança chegou eu estava lá na frente da televisão dançando Galinha Pintadinha e Patati e Patatá. Isso termina até trazendo uma juventude que a gente achava que tinha perdido”, relata Paim.
Adriana Monteiro também destacou como a rotina corrida e o cansaço que chega nas mulheres após as quatro décadas de vida influenciam na maternidade.
“O trabalho com o bebê não se encerra com um mês de vida. Ele é bebê dependente para tudo até no mínimo uns dois anos. Ele não consegue deitar na cama e dormir sozinho, ele não consegue comer sozinho, tomar banho sozinho… Eles têm despertares noturnos que muitas vezes é pesado para uma mulher acima de 45 anos. Acordar de madrugada, dormir tarde… Então tudo isso precisa ser pensado pelo casal que deseja parir após os 40 anos e pensar também que algumas patologias podem permanecer após a gestação”, elucida.
Os cuidados e o amor atemporal
As mulheres que escolhem ter filhos após os 40 anos devem fazer o planejamento no pré-natal, aponta a obstetra. Essa revisão da rotina, antes da geração do bebê, é importante para que as mulheres adaptem suas rotinas com o novo momento de vida.
Aos 40 anos, a maioria das mulheres já tem uma carreira estabelecida, uma jornada de trabalho longa que muitas vezes se estende por mais de 8 horas por dia. Além disso, a correria do dia a dia impede que a alimentação seja adequada. Dessa forma, é importante planejar a gravidez.
“A gravidez após os 40 precisa de mais rigor com os hábitos para que se tenha mais qualidade de vida. A gente que atende uma mulher dessa idade, a gente vai focar muito nessas mudanças de vida a longo prazo. Às vezes perder a noite para uma mulher de 40 anos amamentando, 45 anos ou 48 anos é inviável, porque vai acordar mal, com dor de cabeça, com tontura, não vai conseguir acordar bem para cuidar do neném. Tudo isso precisa ser muito planejado de acordo com a idade da mulher”, explica a médica.
Gilvandira Paim conta que a maternidade na faixa dos 40 anos é diferente de gestar mais jovem. Entre as diferenças, a insegurança que a jovialidade traz, mas que a maturidade fez com que ela enxergasse as coisas de uma forma mais madura.
“Se tornar mãe mais jovem vem acompanhado de muitas incertezas. A gente tem muito medo… medo de errar, medo de não ser suficiente, se a gente vai dar conta… E aos quarenta anos não. Eu já tinha mais segurança, já estava mais calma. É uma visão de mundo realmente mais ampla e a gente vive de forma mais presente entendendo melhor que o tempo passa rápido, que cada momento é precioso”, conta Paim.
A obstetra também aponta que a maternidade após os 40 anos também proporciona mais leveza na relação entre mãe e filho graças a chegada da maturidade.
“Por muitas vezes já ter estudado sobre educação infantil, por ter visto as amigas passando perrengue por causa da maternidade, muitas vezes traz uma certa tranquilidade de como agir diante das adversidades, pela própria maturidade que aquele casal carrega. O que vemos dessas diferenças principais são doenças, diferenças psicológicas em relação ao filho, em relação a vida e uma certa maturidade para lidar com problemas que a gente já sabe que não vão ser eternos e que às vezes a juventude nos dá um desespero e uma angústia”, explica Monteiro.
A maternidade tardia também pode ser um período de aprendizado para as mulheres.
“Aos 40 anos a gente não só educa, a gente também aprende. A gente renasce junto com os filhos, porque já estamos naquela fase de pendurar as chuteiras e o filho vem e te dá uma sacudida. Você embarca junto. Isso é muito bom! A minha experiência tem sido muito boa”, pontua Paim.
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