Investigação

Depoimentos de caso que ‘derrubou’ delegado Tormes por suspeita de desvio de armas vêm à tona

O depoimento de Tormes, aliado às falas de outros investigados, reconstrói os passos de uma operação que apreendeu mais armas do que o número divulgado

delegado
Reprodução/TV Bahia

Os vídeos dos depoimentos do delegado Nilton Tormes e Araújo, exonerado do cargo de coordenador do Departamento de Polícia Metropolitana (Depom), além de policiais e ex-policiais suspeitos de participação em um esquema de desvio de armas, vieram à tona. As gravações, obtidas pela reportagem da TV Bahia, trazem relatos que reforçam a existência do esquema e também lançam luz sobre a execução de duas pessoas.

O depoimento de Tormes, aliado às falas de outros investigados, ajuda a reconstruir os passos de uma operação que apreendeu mais armas do que o número oficialmente apresentado pelos agentes. A ação, realizada em julho de 2024, resultou na descoberta de um bunker em um matagal de Lauro de Freitas, onde criminosos mantinham um arsenal bélico escondido.

As investigações sobre o caso, que corre em segredo de Justiça, dão conta de que a descoberta do esconderijo deu início após o capitão da PM Roque de Jesus Dórea, conhecido como Capitão Dórea, informar ao colega, o cabo Tibério do Vale Alencar, que sabia da existência do bunker de armas e drogas.

A informação teria sido obtida após a morte de um homem de alcunha Nei, apontado como dono do local e ligado a uma facção. Tibério, por sua vez, levou o caso a Nilton Tormes, que teria articulado a participação da equipe de elite Core na operação para “estourar” o local.

No dia da ação, Tormes, Tibério, a equipe da Core e outros policiais se reuniram na Estrada CIA-Aeroporto. As investigações dão conta ainda que chegaram também o Capitão Dórea, o soldado Ernesto Nery, o ex-PM Jorge Adisson, além de outros dois homens apontados como informantes da polícia. Eles seriam Joseval Santos Souza e seu enteado Jeferson Sacramento. 

Joseval, algemado e sem camisa, indicou o caminho até a mata onde as armas estavam enterradas. A denúncia aponta também que o número de armas apreendidas foi bem maior que o registrado oficialmente e que parte do material foi desviada.

Desdobramentos do caso

Em um dos vídeos apresentados pela TV Bahia, o soldado Nery relata que, após a descoberta do bunker, um policial perguntou a Tormes o que fazer com o informante, e o delegado respondeu: “Dê o destino”, frase interpretada pelo MP-BA como ordem para executá-lo. Poucos dias depois, Joseval e Jeferson foram encontrados mortos, com sinais de tortura e ferimentos de bala.

As famílias haviam recebido mensagens dizendo que eles estavam sequestrados, com pedido de R$ 30 mil para a libertação. Uma compra feita com o cartão de crédito de Jeferson ligou Nery ao crime. O PM utilizou o objeto para comprar um lanche de R$12. Ele confessou o uso do cartão, ter ficado com uma das armas e participação nas mortes.

Nos depoimentos, o delegado Adailton Adam, que investigava o desaparecimento, contou ter sido procurado por Tormes e Tibério, que pediram para encerrar o caso. Tibério chegou a sugerir que cada um respondesse individualmente e disse que poderia “derrubar” colegas envolvidos.

Apesar das pressões, Nery, Dórea e Adisson foram presos em agosto de 2024, com drogas, dinheiro e armas, incluindo uma retirada do esconderijo. Uma carta escrita por Dórea mencionava pelo menos dez pistolas desviadas, mas o documento sumiu, conforme denunciou o delegado Adam. 

As investigações continuam, e ainda não se sabe exatamente quantas armas foram desviadas. Inicialmente, a operação foi divulgada como uma das maiores apreensões de armas até então: uma submetralhadora, seis fuzis e mais de mil munições. Mesmo assim, policiais da Core receberam gratificações pela apreensão.

Denúncia

Segundo a denúncia do Ministério Público e da Corregedoria da Polícia Civil, na verdade havia pelo menos 20 armas no local, além de várias pistolas. Todos os investigados estavam na ação e viram o que os policiais fizeram de forma ilegal.